A vergonha da demissão

A vergonha da demissão

É raro entrevistar um executivo com seus 15 ou 20 anos de experiência que não tenha sido demitido ao longo da sua carreira. E é curioso como este momento costuma ser retratado. Primeiro, observa-se claramente a tentativa de não entrar no assunto. E quando a demissão é abordada na entrevista, na grande maioria dos casos percebo um sentimento de vergonha expresso no olhar, na voz ou no semblante do entrevistado.

É fato que, logo após o desligamento, o sentimento que costuma emergir no profissional é outro: a raiva. Boa parte das pessoas se sente injustiçada. É como se a empresa “não tivesse direito de fazer isso” (sem entrar no mérito de o processo ter sido bem conduzido ou não). Essa reação é muitas vezes, no calor da emoção, exagerada. Analisando friamente, assim como qualquer trabalhador tem o direito de pedir desligamento, a empresa também tem o direito de rescindir o contrato sem justa causa. Há regras claras neste sentido. E no mundo atual do trabalho, isso faz parte do jogo.

Contudo, com o passar do tempo, quando o executivo tem que falar sobre o tema, a demissão ganha uma conotação diferente. Note-se um sentimento de rejeição e, muitas vezes, de fracasso. Ainda é muito forte no imaginário das pessoas a visão de que o demitido “não foi bom o suficiente”, “não entregou”, “é pior que os outros” ou ainda mais enfaticamente, “é incompetente”. Sem dúvidas, pode ter havido um gap de performance ou de comportamento que culminou na demissão do profissional. Isso deve ser analisado. Mas outras variáveis podem estar envolvidas.

Muitas demissões começam a se desenhar antes mesmo da admissão. Quantas vezes observamos empresas contratarem profissionais como se fossem “salvadores da pátria” que vão resolver todos os problemas num passe de mágica? Quantas vezes também observamos contratações totalmente desalinhadas com a cultura da empresa? Quantas vezes vemos admissões sem uma avaliação comportamental do profissional versus o que é exigido da posição? Em muitos destes casos, o desligamento é apenas uma questão de tempo.

Em diversas outras situações, o desligamento que se dá por uma questão pragmática: a empresa simplesmente não tem mais como pagar aquele profissional – que acabou ficando caro para o momento do negócio. O perfil do profissional é aderente ao que é necessário, ele entrega o que a empresa precisa, mas economicamente a continuidade do vínculo de emprego simplesmente não é mais viável.

Em suma, tão ou mais importante do que avaliar o que falar para um futuro entrevistador acerca da demissão é refletir criticamente sobre o que ocorreu. O que poderia ter sido feito diferente? O que levar para minhas próximas escolhas de carreira e para meus próximos empregos? O que, na prática, foi pouco influenciado pela minha atuação? Mais do que se autoflagelar, é crucial refletir sobre estas questões neste momento geralmente infeliz das jornadas profissionais, mas que como poucos outros momentos pode gerar muitos aprendizados.

Por: João Paulo Faleiros