O emprego é uma relação, antes de tudo, profissional

O emprego é uma relação, antes de tudo, profissional

Recentemente, entrevistando um executivo, ouvi: “João, fiquei mais de vinte anos naquela empresa. Dei o sangue. Engoli muito sapo, aliás… Mas nunca olhei pro lado. Não fiz sequer uma entrevista em outra empresa! Cresci, fiz amigos e, acima de tudo, entreguei muito. E sempre acreditei nela! Um belo dia, chegaram pra mim e falaram que eu não ficaria mais. Foi um baque! Perdi o chão. Até sabia que isso poderia ocorrer, mas, no fundo, nunca acreditei que aconteceria comigo. Agora, não sei como recomeçar.”

Ouço depoimentos parecidos com boa frequência. Uns dizem que se sentiram enganados. Outros, assumem, mesmo que parcialmente, a responsabilidade, entendendo que foram ingênuos ao acreditarem numa suposta “lealdade eterna” da empresa. Pode até haver um pouco destes dois pontos. Mas a verdade é que não se pode mais achar que a relação de emprego é para a vida toda. Sempre há um início, um meio e um fim. E precisamos estar atentos a isso.

Costumo dizer que, por maior que seja o vínculo emocional nesta relação, ela é, em última análise, profissional. Defendo vínculos longevos – principalmente em posições executivas. Não concordo com líderes que “pulam de galho em galho”, em especial com motivações salariais. Geralmente não conseguem concretizar ciclos de “estratégia – execução – resultados”, e as equipes sofrem com mudanças contínuas de direcionamento. Mas isso não significa que se deve, de forma passiva, aguardar o tempo passar.

Quando executivo, sempre me forcei, pelo menos uma vez ao ano, a fazer uma reflexão individual profunda. Me perguntava: “Está valendo a pena?”. Ciente de que não existe lugar perfeito, a análise era se os benefícios (não só financeiros, mas também em termos de desenvolvimento, qualidade de vida, aderência a valores, entre outros) continuavam significativamente maiores que os aspectos negativos. Se a resposta era “Sim!”, a energia se renovava e eu mantinha o pé no acelerador!

Mas, por vezes, a resposta não foi tão categórica. E, eventualmente, foi “Não”. Nestes casos, a nova pergunta era: “O que posso fazer para mudar este cenário?”. Tive conversas francas com CEOs e busquei me adaptar a novos contextos. Mas houve situações além do meu alcance. Então, sempre com o protagonismo da minha carreira, busquei outros lugares que fizessem mais sentido para mim.

Há quem veja neste movimento uma falta de lealdade do profissional com a empresa. Discordo. Pragmaticamente, se a empresa não está mais satisfeita com o executivo ou não tem mais como remunerá-lo, ela tem a prerrogativa de desligá-lo (obviamente, de forma respeitosa e após realizar os rituais de gestão apropriados). Da mesma forma, se para o profissional não faz mais sentido permanecer, ele também tem total direito de sair. O que não vale é deixar a relação nas mãos exclusivamente de um dos lados (geralmente, o da empresa). Numa relação madura e profissional, ambos têm direitos (e deveres) – inclusive, o de encerrá-la.

Por: João Paulo Faleiros